segunda-feira, 2 de julho de 2012

Políticas de Ensino Superior

A política é a forma priveligiada de defender os interesses  das comunidades e da sociedade em geral. Desta forma, será tanto melhor e mais representativa quanto maior for a participação de todos os sujeitos nos diferentes meios envolvidos.

As políticas de ES serão portanto mais eficazes quanto maior for o envolvimento de todos os seus agentes e na verdade, existe ainda muito a realizar no sentido de satisfazer os anseios da população cujos NES pretendem particularmente defender – os estudantes de ES.

Neste domínio, é sabido que a resposta dada pelas políticas de ES não tem vindo a satisfazer aquelas que são as expectativas dos estudantes, mais particularmente no que toca à sempre controversa acção social através da violação da universalidade do ES. O valor das propinas e até a sua própria existência representam ainda hoje um foco de enorme contestação por parte das massas estudantis.

Os temas que abrangem o ES e marcam constantemente o debate em torno das suas questões são vários (Acção Social, Propinas, Números Clausus, Financiamento e Rede de ES, Empregabilidade, Relação com o tecido empresarial, Autonomia das IES, Estatutos dos Estudantes, Investigação, Pedagogia, etc..)

A seguinte abordagem tentará representar de um modo generalizado as maiores preocupações dos estudantes:

- Propinas:

Segundo a Lei n.º 49/2005  “o valor da propina é fixado em função da natureza dos cursos e da sua qualidade, com um valor mínimo correspondente a 1,3 do salário mínimo nacional em vigor e um valor máximo que não poderá ser superior ao valor fixado no nº 2 do artigo 1.º da tabela anexa ao Decreto-Lei n.o 31 658 (1200 escudos), de 21 de Novembro de 1941, actualizada, para o ano civil anterior, através da aplicação do índice de preços no consumidor do Instituto Nacional de Estatística.” O valor da propina máxima tem ainda em conta a inflação ocorrente no ano civil anterior.


Actualmente o valor mínimo da propina é portanto de €630,5 e o valor máximo, tendo em conta a inflação ocorrentre em 2011 (3,7%), será de €1.036,6 a partir de Setembro de 2012, passando pela primeira vez os €1000 – o maior aumento desde 2003 e que corresponde a um crescimento de 21,5% em relação ao valor da propina máxima desse ano.



As  estruturas político partidárias mais à esquerda defendem a abolição do pagamento de propinas como forma de universalização do ES, no entanto, o mesmo nunca será universal enquanto existamnúmeros cláusus, isto é, uma definição do número de vagas para cada curso e ainda limitações socioeconómicas que impeçam a escalada dos jovens através dos precedentes ciclos de ensino.

Por outro lado e além dos elevados custos que cada estudante de ES representa para o Estado, existe a visão partilhada por Vital Moreira, eurodeputado pelo PS, que aponta às propinas um papel de correcção de desigualdade de oportunidades. Isto é, se o ES fosse gratuito, acentuar-se-iam as desigualdades económicas entre os estudantes com mais posses e os mais frágeis economicamente. Esta visão consiste no seguinte: "quanto menos propinas pagarem os que podem, menos dinheiro existe para apoiar os que realmente precisam que ele seja gratuito".

A verdade é de que as desigualdades continuam a acentuar-se devido ao incumprimento do papel que deve ser desempenhado pelo Estado e que está escrito no Artigo 18.º da Lei de Bases do Financiamento  do ES:

Artigo 18.º Compromisso do Estado

1- O Estado, na sua relação com os estudantes, compromete-se a garantir a existência de um sistema de acção social que permita o acesso ao ensino superior e a frequência das suas instituições a todos os estudantes.

 2 - A acção social garante que nenhum estudante será excluído do subsistema do ensino superior por incapacidade financeira.

-Acção social direta:

É facilmente perceptível que a acção social no ES está longe de atingir os padrões razoáveis no sentido de se tornar um mecanismo que garanta o acesso ao ES a todos os estudantes que não disponham de capacidades financeiras para tal. Ao longo dos últimos anos estiveram em vigor vários regulamentos de atribuição de bolsas de estudo de acção social que não conseguiram garantir a igualdade de oportunidades nem os anseios dos estudantes.

O caso do último regulamento de atribuição de bolsas é gritante pois não deu continuidade a um regime transitório que protegia os estudantes que tinham ingressado no ES na vigência de regras anteriores. Isto é, ao longo do percurso académico de milhares de estudantes que respeitaram o regulamento vigente, aquando da primeira vez que obtiveram bolsa, as suas expectativas foram defraudadas pela alteração de regras que definem os valores atríbuidos aos rendimentos que os seus agregados familiares devem possuir para que estes, sejam classificados como carentes economicamente. Tratou-se, nada mais nada menos, do que da violação de um contrato por parte do governo pela alteração das regras “a meio do jogo”.

Mais do que isto, é do conhecimento geral o constante atraso que ocorre na atribuição de bolsas de estudo, que tem vindo a marginalizar milhares de estudantes. Mais ainda,  não devemos esquecer a elevada redução do número de estudantes beneficiários, este ano colocado ao nível do ano 2000 com uma redução na ordem dos 16% em relação ao ano letivo anterior – um enorme retrocesso.


-Acção social indireta:

No presente, a maior preocupação acerca deste tópico prende-se com os passes sociais. Não é para menos. Se as bolsas de estudo por si só não abarcam todos os estudantes carenciados, o preço da totalidade das mensalidades  dos transportes públicos por ano lectivo, com o fim dos descontos nos passes sub-23, está hoje, para os estudantes mais deslocados, ao nível de uma propina com o valor mínimo atribuído por lei. Relembre-se que a meio deste ano lectivo os passes sociais perderam 25% do seu desconto e que a partir do próximo ano lectivo os restantes 25%, dos 50% definidos aquando da criação dos passes sub-23,  deixarão também de existir.


Entre todas as outras problemáticas derivadas das políticas, destaca-se o frágil número de estágios profissionais que dificulta não só a aquisição da experiência (por si só representante de uma mais valia para o currículo de qualquer jovem) como também impossibilita o acesso a algumas ordens profissionais. Aliás, cada vez se sente mais uma maior necessidade de articulação entre as IES e o tecido empresarial, que a meu ver precisa de sofrer uma evolução que adapte as instituições às necessidades da Economia mas sem nunca colocar o ES num papel de submissão. Isto é, o ES não pode favorecer os grandes interesses económicos e tem de conseguir um meio termo que possibilite a inovação e o empreendedorismo e simultaneamente uma adequação ao mercado do trabalho. Daí surge a importância da não descaracterização do Ensino, nomeadamente no que toca à importante diferenciação entre os Institutos Politécnicos e as Universidades, sem se pretender com esta afirmação colocá-los em patamares qualitativos distintos. A rede de ES necessita de uma maior uniformização da excelência, sem esquecer a competitivdade e as vantagens inerentes à mesma através das diferenças entre IES. Uma rede de ES ajustada e cuja excelência seja padronizada, seria sem dúvida uma mais valia, que tenderia a evitar a mobilidade dos estudantes e a promover a manutenção das suas zonas de conforto bem como a promoção de um maior desenvolvimento da envolvente económica.

Os númerus clausus representam ainda aquele que deve ser um balanceamento do número de estudantes que ingressam em cada ano letivo em cada curso e têm de ser avaliados mediante o sucesso académico dos estudantes –  apesar do sucesso académico dever ser maximizado, é necessário que este seja permanentemente avaliado de uma forma realista para que se estime correctamente o número de diplomados a ser colocado no mercado de trabalho em cada ano. No entanto, existirá sempre uma problemática que diz respeito às imprevisibilidades inerentes ao desenvolvimento económico do país que a qualquer momento pode, por motivos conjunturais, requerer mais ou menos profissionais qualificados nas diferentes áreas. É uma tarefa hercúlea que encontra na sustentabilidade da Segurança Social o seu maior problema – o número de profissionais que se reformam é muito inferior ao número de diplomados que ingressam pela primeira vez no mercado de trabalho usufruindo de um curso de ES.

A solução encontra-se num passado muito recente, no legado do último governo do Partido Socialista e é completamente contrária às políticas de cortes cegos do actual governo, designadamente no investimento na inovação e na investigação científica.

Além do prolongamento da presença dos jovens no ES que adia o ingresso no mercado de trabalho, a  promoção do número de doutorandos, pelo menos na área da Ciência e Tecnologia, representa o primeiro passo para o desenvolvimento de novos produtos que possam ser colocados ao serviço da Economia, impulsionando as exportações das nossas empresas e a criação de postos de trabalho. O nosso país necessita de investimento nas áreas supracitadas, colocando a inteligência das novas gerações ao serviço do desenvolvimento nacional (precisamente o contrário do pretendido pelo governo com os incentivos à emigração ) à imagem dos pólos de investigação existentes em Harvard e no MIT, nos Estados Unidos da América que inclusive acolhem cérebros de outros países.

A verdade é que têm sido os mesmos que reduziram o orçamento no ES, (muito além do memorando) como se de um despesismo se tratasse, a pactuar pacificamente com o desprezo de todo o investimento no desenvolvimento intelectual que até aqui foi feito e que efetivamente representa a solução para grande parte dos problemas económicos do nosso país. Mais do que isto, o investimento na Educação é o primeiro passo para o desenvolvimento social e para o combate às desigualdades económicas.

Para que não se releguem às questões economicistas as temáticas que mais preocupam os estudantes, é de realçar aquele que é o tema mais directamente interligado com o rendimento académico dos estudantes de ES – a pedagogia (ou a falta dela). A fraca orientação tutorial é um dos problemas que tem vindo a ser levantado ao longo da implementação do Tratado de Bolonha, tratado este, cujos pressupostos visam uma maior autonomia do estudante tornando o seu acompanhamento diminuto por parte dos docentes.


Esta problemática não se fica por aqui. De facto, a mudança de paradigma não foi acompanhada da dotação de intrumentos e ferramentas de aprendizagem que dotassem os estudantes de competências para um estudo mais independente. Acrescido a este problema, surge ainda a controversa questão da falta de formação pedagógica dos docentes de ES. Em Portugal ao contrário de outros países, não existe qualquer tipo de formação pedagógica obrigatória no ensino pós-secundário, sendo que os docentes são apenas contratados mediante as suas qualidades científicas, que obviamente não são indicadores suficientes das capacidades que detêm para leccionar com o sentido de optimização do rendimento académico dos estudantes. No que toca à pedagogia no ES, existem três elementos chave cuja implementação deve ser tornada realidade tão breve quanto possível e que se baseiam naquilo que é já realidade noutras latitudes:

-Realização de provas de aptidão pedagógica no momento da contratação dos docentes de ES;

-Realização de formações pedagógicas periódicas com presença obrigatória;

-Implementação de um sistema de avaliação anual das capacidades pedagógicas dos docentes.

A avaliação das capacidades pedagógicas dos docentes deve ser uma realidade que tenha repercurssões no futuro dos mesmos enquanto profissionais do ensino. De facto, existem sistemas de avaliação pedagógica vigentes que funcionam à base de inquéritos pedagógicos mas que não servem o seu propósito. Estes inquéritos que até aqui tinham vindo a ser preenchidos manualmente pelos estudantes, serviam apenas para expor a cada docente individualmente, a sua classificação e a média das classificações obtidas pela totalidade dos docentes do seu curso/IES, sem que daí surgisse qualquer consequência. Hoje em dia, estes inquéritos já nem para isso servem, na medida em que tem havido uma transição para o preenchimento dos mesmos via internet, facto que pelo reduzido número da amostra, origina resultados pouco fiáveis estatisticamente.
André Lopes

terça-feira, 6 de março de 2012

Primárias, sim!

As eleições primárias têm vindo ao longo dos anos a entusiasmar o mundo como um mecanismo diferente de abrir os partidos políticos à sociedade. O modelo americano é sem dúvida o mais conhecido pelo mediatismo e dimensão na qual candidatos de vários estados e de dois grandes partidos têm vindo, com a envolvência de milhões de pessoas, a disputar as eleições presidenciais.

Em Portugal a questão das eleições primárias tem surgido nos últimos tempos como uma nova forma de modernizar os partidos políticos e de os abrir à sociedade não passando até ao momento de uma ideia que carece de mais do que o seu lançamento nos fóruns de debate para que seja posta em prática.

É necessário um grande esforço dos militantes dos partidos políticos portugueses para que de uma vez por todas se coloquem na balança, de um dos lados “a união do partido” e do outro a Democracia e a qualidade dos candidatos que livremente quiserem manifestar e exercer a sua candidatura.

Nas últimas eleições internas do Partido Socialista surgiram dois candidatos que com a vontade de introduzir este tipo de eleição no partido divergiram na limitação dos eleitores, entre o escrutínio aberto a simpatizantes ou limitado apenas a militantes do partido no sentido de se valorizar a militância e impedir que falsos simpatizantes e até militantes de outros partidos pudessem fazer parte da escolha - é de facto legítimo que se defenda este último argumento enquanto as regras do jogo não forem iguais para todos.

Já no último congresso do PSD a possibilidade de eleições primárias (fechadas à sociedade) para a escolha de presidentes de câmara, proposta pelo actual Primeiro-Ministro, foi completamente posta de parte pelos militantes com a argumentação da divisão do partido pela possibilidade de surgirem posteriormente candidaturas independentes que clivassem as estruturas e as potencialidades de vitória eleitoral.

Em França as eleições internas dos maiores partidos políticos (PS e UMP) não conseguiam abranger sequer 1% do eleitorado francês (à imagem do que acontece actualmente em Portugal) sendo que os candidatos aos altos cargos do panorama político se limitavam ao escrutínio dos militantes. Com o surgimento das primárias no Partido Socialista francês, foram conseguidos os votos de 7% do eleitorado - um feito inédito que despertou a temática das primárias e mostrou que a população tem interesse neste revolucionário método de escolha que visa escolher os melhores candidatos.

Martine Aubry saúda François Hollande logo após o resultado das primárias abertas à sociedade  francesa, mostrando que a união do partido não foi afectada.

Voltando a Portugal, torna-se necessária uma profunda discussão no sentido de promover este sistema eleitoral partidário.

É necessário que um dos partidos arrisque a iniciativa (com abertura a todo o eleitorado) sem o receio de perder autarquias ou outros orgãos administrativos. Para isso basta reflectir acerca do valor da Democracia (até porque tendencionalmente se acabariam os sindicatos de voto). Por outro lado é necessário que a mesma Democracia prevaleça naqueles que se candidatam por essa via - se se perde uma vez segundo padrões ideológicos, para quê tentar uma segunda vez numa candidatura independente pondo em causa a ideologia que se defende, ainda que seja plural, colocando em primeiro interesses singulares?


No caso concreto do Partido Socialista, desde que se  tem equacionado a realização de eleições primárias fechadas surgiu uma grande preocupação quanto ao crescimento (na ordem dos milhares) do número dos militantes! Um crescimento que assusta pela quantidade de fraudes eleitorais a que se tem assistido e às quais este tipo de eleição proposto denota não conseguir responder de forma saudável e transparente.

Torna-se necessária a implantação de eleições primárias abertas nos partidos políticos portugueses nem que para isso seja necessário um cruzamento de dados que assegure a unicidade do voto.

Urge a necessidade de um novo paradigma que defenda a transparência, melhores candidatos e a envolvência de uma população cada vez mais adormecida no que toca à participação política pela falta de confiança legítima nos “políticos” e nos diferentes partidos.

É necessária uma intervenção urgente que mude a apatia conjuntural e afirme a Democracia!


André Lopes

sábado, 14 de janeiro de 2012

O que se espera das juventudes partidárias

As juventudes partidárias existem com o intuito de promover a afirmação dos jovens na sociedade através da fomentação de políticas que de facto promovam a sua emancipação e o seu enquadramento social. Existem, para que os jovens tenham de facto uma palavra a dizer na tomada das decisões políticas. No entanto, espera-se que os seus militantes, militem com o sentido de cidadania, exercendo a militância com o objetivo de fazer mais pela juventude e mais pela sociedade, ao invés de se focarem no objectivo de fazer mais pelo seu partido. 

Esta é uma missão digna, que não deve descurar contudo a correcta inserção ideológica e a plena compreensão da defesa de alguns valores inerentes às diferentes ideologias e à pluralidade das estruturas partidárias, que por si só permite uma maior independência também dentro da estrutura em que estamos inseridos.

A construção de políticas de juventude e a defesa dos valores em que se acredita não pode contudo ser limitada à parte teórica. O exercício da cidadania política e partidária é um exercício que por vezes se torna rabuscado quando o papel do militante limita-se à passividade de não fiscalizar, questionar e querer saber mais sobre a conjuntura actual e ainda, acerca do panorama interno da sua estrutura partidária.

Se os partidos políticos em Portugal prezam a democracia no seu país e da mesma forma o fazem as juventudes partidárias, a luta por esta mesma democracia deve permanecer internamente, havendo para isso a necessidade de conhecimento das regras do jogo. É algo simples que pode fazer a diferença, e de facto faz quando se pretende promover a democracia e a autonomia individual que é essencial na arte que é fazer bem política.

Se há também algo fundamental em política é o debate e a discussão de ideias, sendo para isso necessária a sua criação, desenvolvimento e apresentação. Sem ideias a política é vazia de conteúdo e cinge-se ao facilitismo do agitar de bandeiras, que até nem custa com a ajuda do vento.

Este é um trabalho árduo que deve ser aproveitado quando se está no poder e realçado quando se está na oposição, apresentando alternativas. O papel de uma juventude partidária é esse, influenciar o seu partido sem se deixar influenciar em torno de individualidades opacas, aproveitando para pôr políticas de juventude em prática e promover junto dos jovens a sua participação através da informação e auscultação permanente. E promover a cidadania dos jovens não é necessariamente integra-los nos partidos. É também incitar à criação de mecanismos que promovam a sua representatividade como por exemplo os Conselhos Municipais da Juventude ou os orçamentos participativos.

Se por outra via os queremos integrar nas juventudes partidárias, que não é menos bom, devemos garantir que existe o conhecimento dos direitos e deveres dos militantes e acima de tudo fazê-los sentirem-se representados, sempre na defesa de uma juventude mais forte, mais capaz, mais informada e mais empreendedora.

Vamos mudar o paradigma!?




domingo, 27 de novembro de 2011

Participação Política

A participação política ou a falta dela é em Portugal e não só, um tema bastante actual, não descurando contudo a existência de países em que a Política é bem mais participada.

No nosso país em especial e de uma forma mais transparente para a sociedade, os números da participação política, revelam-se com mais pertinência aquando dos momentos eleitorais, onde podemos verificar desde os primórdios da democracia portuguesa, o aumento da abstenção, que já chegou a ser de apenas 8% , também claramente, devido a uma conjuntura completamente diferente.

Engane-se no entanto, quem pensar que a participação política consiste apenas em votar de 4 em 4 anos ou de 5 em 5. Interessante será também mostrar aos muitos desconhecedores, os números reveladores da participação política, mesmo dentro dos partidos, onde por muito estranho que pareça, o número de votantes dos actuais líderes dos principais partidos de Portugal (PS e PSD), cabem sem encher , num estádio de Futebol como o do Futebol Clube do Porto.

Mas o que será que esta ridícula percentagem da população em termos numéricos, tem a mais do que a larga maioria? Será que são mais capazes e mais inteligentes que todos os outros ou serão apenas aqueles que têm algum interesse pela coisa pública, ou por outro lado, como muitas vezes ouvimos dizer, têm o interesse de elevar as suas próprias aspirações pessoais?

Para fazermos uma comparação de um ponto de vista histórico, não podia deixar de referir o exemplo da antiga Grécia, onde surgiu a palavra idiota, que hoje em dia é utilizada para classificar alguns políticos, mas que na altura servia para classificar quem não tinha qualquer interesse em fazer parte das decisões do Estado grego, que funcionava através de um modelo de democracia directa, também muito falado actualmente.

No entanto, torna-se pertinente que nos perguntemos a nós próprios as razões que nos levam a assitir a tanta passividade no que toca a esta temática. Porque será que em Portugal, tão poucas pessoas aderem aos Partidos Políticos? Será que é pelo preconceito da dependência? Será que é por desconhecerem as ideologias que lhes estão inerentes? Será pela má fama que tem vindo a crescer exponencialmente devido a falsas promessas pré-eleitorais e devido a casos mediáticos de corrupção?
Sem dúvida que todas estas questões têm uma resposta positiva, mas todas elas devem ser alvo de uma profunda reflexão pois todas elas se tornam falaciosas. Ninguém perde a independência ao entrar num Partido Político, antes pelo contrário! Entrar num partido político é acrescentar independência a nós próprios, pois mais vale que escolhamos um partido livremente e ideologicamente e dentro dele façamos parte das decisões, do que deixar que todos os partidos políticos, decidam tudo por nós, inclusive quem são os seus candidatos aos altos cargos da vida política do nosso país.

Torna-se pertinente concluir que hoje em dia, as nossas gerações que são de facto as mais formadas de sempre, não conhecem as ideologias políticas dos diferentes partidos, não tendo por vezes qualquer noção da diferença entre a esquerda e a direita.

Este não é um problema dos jovens, é um problema do modelo educativo que não oferece qualquer tipo de competências transversais que permitam que nos formemos como cidadãos activos da nossa sociedade democrática. De facto, ser cidadão e participar na política, não é participar apenas dentro dos partidos políticos e até é sabido, que são as causas que mais mobilizam, sendo de realçar a importância dos movimentos associativos.

Mesmo para quem não se quer ligar de alguma forma a associações ou partidos políticos, continuamos a não ter desculpa para tamanho alheamento, pois temos a oportunidade de algumas vezes por ano, assistir e intervir em assembleias de freguesia e municipais, meramente por sermos cidadãos dos respectivos espaços de residência. Mas claro, quem é que aprende isto na escola, mesmo apesar de já há muitos anos existir uma disciplina com o nome “Formação Cívica”? Esta passividade quase cultural, só poderá mudar alguma vez, através da educação para a cidadania!

Respondendo à última das falácias, resta-me referir que a corrupção  está patente em todas as àreas e domínios da sociedade, não sendo no entanto, uma desculpa para os titulares de cargos políticos, que de facto têm vindo a fazer falsas promessas.

Aliás, duvido que exista alguém que pense conscientemente bem da classe política em Portugal e deste modelo democrático que se diz representar os cidadãos. Sei que a todos nós jovens e cada vez mais, a política desilude! Mas também sei e quero-vos convencer que ela só muda com a nossa atitude, pois não há mudança sem renovação. É disto que nos temos de lembrar quando assistimos nas ruas a manifestações com centenas de milhar de jovens e vemos simultaneamente, líderes dos grandes partidos a serem eleitos dentro dos mesmos com apenas 27 000 votos. Mais do que sermos reaccionários, necessitamos hoje, de idealizar e construir  políticas virtuosas!

Estimados amigos e amigas, nós temos efectivamente, de nos tranformar na mudança que queremos ver!

domingo, 9 de outubro de 2011

A Violência no Namoro: uma Necessidade de Prevenção nas Escolas

A violência no namoro tem sido considerada progressivamente um problema da nossa sociedade, contudo, esta questão encontra-se à margem dos discursos sociais e educativos, bem como carece de atenção e de procura de respostas por parte da comunidade científica, académica e social. Numa tentativa de compreender os motivos subjacentes à marginalização desta problemática independentemente da sua presença na nossa comunidade, importa referir alguns aspectos que possam ser responsáveis.

De forma a promover a compreensão de um problema, bem como o desenvolvimento e a implementação de uma resposta, é imprescindível definir de antemão o problema. É curioso verificar que a definição de violência no namoro ainda permanece vaga para uma grande parte da nossa sociedade, principalmente para os mais novos. A barreira entre a violência e a não-violência nem sempre é nítida, sendo então fundamental educar os jovens para essa distinção e, consequentemente, educá-los para a não-violência. Tendo em conta que as escolas representam o lugar das aprendizagens das crianças e dos jovens por excelência, o contexto no qual as crianças e os jovens vão aprendendo a ser cidadãos, a ser membros activos da nossa sociedade, a respeitar normas sociais e a interiorizar determinados valores, é fundamental que as escolas dirigem as suas acções para promover relacionamentos afectivos saudáveis entre os jovens.

Os estabelecimentos de ensino são o lugar perfeito para despertar os jovens para este problema e para as suas proporções alarmantes. De facto, estima-se que 20 a 30% dos jovens são vítimas de violência nos seus relacionamentos íntimos, sendo que essa taxa aumenta drasticamente a partir do casamento. Essas situações muito se devem à falta de conhecimento por parte dos mais novos, quer sobre o que é a violência no namoro, quer sobre as suas várias formas de manifestação ou ainda sobre formas de agir nessas situações. A escola é terreno fértil para proporcionar essas informações e chegar mais rápido e eficazmente a essa população de tão difícil acesso, bem como representa o contexto ideal para a partilha de ideias, para estimular o debate e permitir assim a desmistificação de algumas crenças erradas, nomeadamente confundir comportamentos de controlo com provas de amor.

Tendo em consideração o conjunto exaustivo de potencialidades detidas pelos estabelecimentos de ensino para apelar à atenção dos mais novos sobre a violência nos relacionamentos íntimos e para educá-los para a não-violência, por que motivos esta questão não permanece à margem dos discursos socio-educativos? Seria assim tão difícil e insustentável elaborar um programa curricular sobre a temática, visando a aquisição de conhecimentos sobre o fenómeno, seu enquadramento legal, o empoderamento dos mais novos para o reconhecimento de situações íntimas abusivas , a capacidade de resposta nessas situações ou ainda a tomada de conhecimento dos recursos na comunidade.

Os esforços preventivos ao nível da violência no namoro têm sido muito tímidos, sendo as elevadas taxas de violência no namoro um exemplo ilustrativo. De facto, a violência no namoro tem vindo a aumentar de ano para ano, sendo que um em cada quatro jovens sofre violência nos relacionamentos íntimos, de acordo com os dados fornecidos pela APAV- Associação Portuguesa de Apoio à Vítima. Numa investigação levada a cabo por esta instituição, 67% dos jovens inquiridos revelaram ter presenciado situações de violência íntima, permitindo comprovar o aumento das taxas de violência registadas no nosso país.

Perante este panorama, a integração de um programa curricular sobre esta temática é fundamental, quer a nível da prevenção, quer a nível da intervenção junto dos jovens, sendo esse programa subordinado à promoção de relacionamentos afectivos saudáveis entre os jovens.

Andréa Da Costa

terça-feira, 13 de setembro de 2011

O Abandono Escolar e a Desqualificação: Como Combater esta Realidade?


O Abandono Escolar e a Desqualificação: Como Combater esta Realidade?

Agora que se inicia mais um ano lectivo, um fenómeno volta a ser alvo de grande preocupação por parte da população portuguesa, sendo este o abandono escolar. Este fenómeno representa um problema massivo com o qual o nosso país em geral, e o sistema de ensino, em particular, se têm confrontado. Tendo em atenção as graves consequências desta situação para o nosso país, importa investigar na tentativa de compreender as razões que se encontram na origem do abandono escolar. Que motivos levam os jovens estudantes a desistir do seu percurso escolar? Serão motivos pessoais? Sociais? Familiares? Económicos? Aqui surge um pequeno ensaio orientado para a compreensão da “crise” escolar que afecta de forma alarmante a nossa sociedade e o seu futuro, permitindo, desta forma, reflectir sobre potenciais soluções para este problema de ordem nacional.

Antes de mais, o abandono escolar em Portugal e na Europa em geral:

O abandono escolar é um fenómeno para o qual Portugal se destaca em relação aos restantes países da Europa. Cerca de 3.500.000 dos actuais trabalhadores têm um nível de escolaridade inferior ao ensino secundário, dos quais 2.600.000 inferior ao 9.º ano. Cerca de 485.000 jovens entre os 18 e os 24 anos (45% do total) estão hoje a trabalhar sem terem concluído o 12º ano, 266.000 dos quais não chegaram a concluir o 9.º ano. Também se destacam assimetrias a nível nacional, sendo que existem diferenças nítidas relativamente ao rendimento escolar no litoral e no interior do país, predominando uma taxa de 17.4% de analfabetismo nas regiões da Beira Interior Sul. Talvez esteja na hora de impulsionar mudanças nas políticas educativas de forma a combater o abandono escolar e a desqualificação decorrente deste fenómeno.

Que factores levam os jovens portugueses a abandonar as salas de aula?

É verdade que um factor predominante no abandono escolar consiste no desejo de autonomia financeira que os jovens acabam por desenvolver, nomeadamente por nos encontrarmos numa sociedade altamente consumista, levando-os a optar por iniciar uma vida activa precoce em detrimento da busca por uma maior e melhor aquisição de competências e qualificações. Contudo, esta “desculpa” não se aplica a todos os casos, nem de forma exclusiva. Do meu ver, existem quatro agentes responsáveis por esta situação, uns com mais responsabilidade que outros, variando de caso para caso, sendo estes o próprio aluno, a escola, a família, bem como o mercado de trabalho.

O aluno pode ser tido como responsável na medida em que ele é agente de si próprio, das suas escolhas, actuando conforme as suas convicções e vontades, mas também de acordo com as suas características pessoais, cognitivas, emocionais e comportamentais. De facto, as dificuldades de aprendizagem do aluno ou ainda o seu baixo rendimento escolar podem estar na origem de um desânimo aprendido, promovendo pensamentos negativos, como por exemplo a incapacidade em obter bons resultados escolares, levando o aluno a optar por iniciar uma vida activa precoce. A falta de interesse pela escola, a desvalorização pelo sucesso académico, o isolamento social, a ansiedade ou ainda problemas depressivos podem também ser responsáveis da desistência do mundo do ensino pelos nossos estudantes. Por fim, os problemas comportamentais dos nossos alunos, tais como a agressividade, a delinquência, o consumo de álcool e de drogas, exercem também algum peso nas decisões e atitudes dos jovens estudantes. Pois, esses comportamentos acabam por ser alvo de punição no contexto de sala de aula e estimulam a “fuga” do aluno dos estabelecimentos de ensino.

O factor “família” também se destaca desde já como responsável pelo abandono escolar. O facto de pertencer a famílias de baixa qualificação, com baixos rendimentos e dificuldades de ordem financeira origina, muitas vezes, a saída prematura dos jovens do sistema de ensino. O padrão de família ao qual cada aluno pertence influencia inevitavelmente a trajectória escolar e laboral deste útlimo, uma vez que a consciencialização das implicações financeiras inerentes ao ingresso no ensino secundário e universitário promove a desistência do percurso escolar, de modo a não sobrecarregar os pais com despesas associadas à escolaridade dos filhos. Contudo, a influência familiar nas escolhas do aluno não se restringe aos recursos económicos, mas abrange também outras esferas, tais como as expectativas que os próprios pais alimentam sobre o presente e o futuro académico dos seus filhos. Baixas expectativas parentais encontram-se infelizmente associadas ao abandono escolar dos filhos, tais como práticas parentais desadequadas, sendo exemplos um suporte emocional deficiente ou ainda uma falta de envolvimento dos pais na vida escolar dos educandos.

No que concerne a responsabilidade do sistema de ensino para o abandono escolar, pode-se referir de antemão as dificuldades com que as escolas se deparam para motivar os alunos e desenvolver o seu interesse pela educação e formação. De facto, as expectativas e ambições dos jovens encontram-se cada vez mais afastadas dos conteúdos leccionados nas aulas, ou seja, o sistema de ensino não tem respondido aos projectos de vida dos estudantes. Também é de destacar a influência das atitudes do próprio professor, figura de autoridade no contexto escolar. De facto, o ambiente existente na sala de aula é altamente condicionante da motivação e consequente rendimento escolar do aluno. Desta forma, o professor representa um agente influente para melhorar o rendimento escolar dos estudantes, quer em termos de organização da sala de aula, quer em termos da relação que este desenvolve com os seus alunos.

Por último, no que toca ao papel desempenhado pelo mercado de trabalho no abandono escolar e na desqualificação da população portuguesa, importa realçar desde já o predomínio de baixo nível de exigências em termos de qualificação. De facto, o nosso país, quando comparado com a Alemanha ou ainda o Japão, tem apostado numa baixa qualificação e, consequentemente, numa economia de baixos salários. Destaca-se então um erro notável uma vez que este não parece ser o rumo certo para o êxito e o desenvolvimento do nosso país em geral e da qualidade de vida dos seus habitantes em partilcular. Este factor associado ao carácter consumista da nossa sociedade impulsiona os jovens portugueses a abandonar as salas de aula, a favor de um ingresso precoce no mundo do trabalho.


Soluções para combater o abandono escolar?

A saída antecipada dos jovens do sistema de ensino é muito negativa e implica graves consequências por se tratar de uma saída desqualificada!! É uma multidão de jovens que abandona a escola, atraída pelo mercado laboral, chegando aos postos de trabalho sem qualquer qualificação profissional. Trata-se de um factor de pobreza de competências, de saberes, de saber-fazer e de escolhas. Deve-se então combater urgentemente esta situação. Relembra-se que a qualificação de um jovem é fundamental para o seu crescimento pessoal, para a sua auto-estima e dignidade, mas também para o desenvolvimento da sua região e do seu país. Constituindo o abandono escolar e a desqualificação da nossa população activa um obstáculo ao crescimento económico, ao aumento da produtividade e da competitividade do nosso país, importa reflectir sobre soluções para combater esta situação.

Do meu ver, devem ser efectuadas grandes mudanças em cada uma das dimensões supramencionadas. Em primeiro lugar, parece imprescindível investir num maior apoio emocional aos alunos, quer por parte do núcleo familiar, quer por parte das escolas, abrangendo professores e psicólogos. É necessário dotar os alunos de uma maior auto-confiança, motivação e perseverança apesar dos possíveis insucessos académicos, tendo em conta que um baixo rendimento escolar e baixas expectativas dos pais têm sido fortemente associados à atitude de desistência dos alunos. Um maior envolvimento dos pais na vida académica dos filhos (assistir a reuniões de encarregados de educação por exemplo) poderia contribuir para o aumento da motivação dos educandos. A solução para esta questão também se relaciona com mudanças de carácter económico, mais precisamente no que diz respeito às exigências do mercado de trabalho. Sendo a mão-de-obra desqualificada um entrave para o aumento da competitividade, da eficácia e da produtividade, parece relevante considerar o investimento na alta especialização constituindo um elemento chave para o nosso país aumentar a sua competitividade, nomeadamente permitindo avanços tecnológicos e ainda um aumento da qualidade dos nossos produtos.

Por outro lado, também devem ser incutidas mudanças no próprio sistema de ensino, dado que este carrega uma certa responsabilidade pela falta de motivação e interesse do aluno no investimento académico. Desta forma, seria pertinente promover alterações nos conteúdos leccionados nas aulas, como por exemplo conteúdos actuais mais susceptíveis de oferecer resposta aos projectos de vida e às ambições dos jovens estudantes. A promoção de actividades extra-curriculares poderia também constituir uma alternativa ao desinteresse dos alunos pela escola, bem como investir em cursos profissionalmente qualificantes. No ensino básico, as ofertas desta natureza são muito reduzidas, concentrando-se nos alunos com idade superior a 15 anos.

Evoluções notáveis nos últimos anos

Apesar do quadro negro aqui traçado sobre a escolaridade e qualificação dos jovens portugueses, importa conferir um certo realce à evolução positiva que o nosso país tem conhecido, nomeadamente através da iniciativa das Novas Oportunidades. De facto, em 2001 registavam-se taxas de analfabetismo consideravelmente superiores aos dias de hoje, sendo que em 2001 a nossa população contava com uma taxa de analfabetismo de 9%, bem como apenas 35,1% possuíam o primeiro ciclo do ensino básico. Contudo, foi possível verificar uma evolução notável no ano de 2008, contando a nossa população com uma taxa de alfabetização de 94,9! Em 1980, Portugal contava com 87 256 matrículas no ensino superior e, em 2004 com 373 891. Portugal tem conhecido uma evolução notável no número de matriculados em estudos superiores, em todas as categorias, principalmente em doutoramentos e mestrados! Parece então fundamental uma intervenção focalizada e continuada na luta contra o abandono escolar, sendo um caminho imprescindível para promover o crescimento do nosso país e uma sociedade plenamente desenvolvida em todas as suas dimensões.

Andréa Da Costa

domingo, 4 de setembro de 2011

A legalização da prostituição: porque não??

A prostituição representa uma prática secular e consideravelmente presente no nosso país. Desde sempre foram surgindo múltiplas perspectivas acerca do mundo do trabalho sexual, em grande parte pelas dificuldades existentes e predominantes na compreensão dos motivos que se encontram na origem dessa actividade. Ao longo dos tempos, foi possível verificar nítidas nuances na visão que a nossa sociedade alimenta sobre o mundo da prostituição, acabando por criar entraves mais ou menos acentuados à vida das pessoas envolvidas nessa prática. Em primeiro lugar, salienta-se o controlo exercido pela instituição religiosa pelo facto de essas pessoas serem consideradas destruidoras da fé, em segundo lugar surge a proibição expressa nos códigos civis e, por último, hoje deparamo-nos com um esforço para a legalização dessa actividade.

É interessante verificar a criação e implementação de diferentes modelos de legislação com um posicionamento bem distinto perante a prostituição. Pode-se referir desde já o modelo de regulamentação desenvolvido no século XVIII, modelo o qual visava a distinção nítida entre quem praticava o trabalho sexual e a restante população, passando nomeadamente pela inspecção médica obrigatória das mulheres prostitutas e pelo tratamento compulsivo ou detenção dessas mulheres no caso de doenças. O modelo proibicionista emergiu no século XX, nomedamente em virtude das taxas elevadas de práticas de trabalho sexual clandestinas, sendo que em 1962 a prostituição passa a ser uma prática legalmente proibida. As razões para o estabelecimento de medidas de cariz proibicionista assentam principalmente na transmissão de doenças sexuais devido à prática da prostituição. Do meu ver, a existência dessas doenças apresenta-se como justificação secundária da repressão, na medida em que uma pessoa pode ter vários parceiros sexuais e não contrair nenhuma doença caso recorrer a práticas seguras. Para além disso, o modelo proibicionista não interrompeu as práticas de trabalho sexual e agravou as condições do seu exercício. Assim, a repressão exercida sobre os trabalhadores do sexo parece derivar principalmente de uma necessidade de “eliminar” aquilo que não se compreende e não se tolera, não se tratando de uma preocupação com a saúde individual e pública.

As medidas proibicionistas não são então “bem-vindas” se a finalidade é de controlar as doenças, uma vez que proibir e problematizar não constituem um meio eficaz, sendo preferível optar pela prevenção, parecendo ser nesse sentido que a nossa sociedade deve actuar.
Importa destacar a construção de uma carga simbólica negativa em torno da prostituição, sendo o trabalhador sexual agregado ao grupo definido como “grupos de risco”, ao lado dos homossexuais ou ainda dos consumidores de drogas, enquanto que na minha perspectiva estes constituem “grupos em risco”, uma vez que estão sujeitos a múltiplas vulnerabilidades. O trabalhador sexual tem visto a sua própria identidade social marcada, “manchada” por uma chuva de preconceitos e estereótipos, sendo reduzido à condição de transgressor das normas e regras de ordem social. Não estaria na origem dessa construção social a necessidade de encontrar um culpado para determinados problemas de ordem moral e social, nomeadamente culpar as mulheres da traição dos maridos infiéis que recorrem a esses serviços? De facto, tem-se desenvolvido um estigma relativamente à essa prática e uma discriminação quanto ao trabalhador sexual, o qual era e ainda é responsabilizado pela transmissão de doenças sexuais, pela degradação física e moral dos homens e, consequentemente, pela destruição de lares.

Considero fundamental chamar atenção para a subjectividade que caracteriza a perspectiva da nossa sociedade actual bem das gerações anteriores, as quais focalizam a sua atenção principalmente nas doenças sexualmente transmissíveis, não olhando para outros problemas que podem surgir associados a essa prática. De facto, o trabalhador sexual corre diversos riscos, nomeadamente associados ao risco de sofrer violência por parte dos clientes, dos proxenetas, da comunidade em geral ou ainda das autoridades policiais, fazendo com que o mundo da prostituição ficasse bastante desprotegido. Quem da nossa sociedade olha para os trabalhadores do sexo dessa forma? Quem na sociedade se preocupa mais com a segurança dessas pessoas do que com os ditos danos que elas causam?

A legalização da prostituição surge como uma resposta para o vasto leque de situações problemáticas que afectam a vida da sociedade em geral e dos trabalhadores do sexo em particular. De facto, a legalização dessa prática representaria o culminar de uma luta pela conquista dos direitos civis e políticos dessas pessoas, e pela reinvidicação do direito de exercer a profissão em condições dignas, com a garantia de direitos e o cumprimento de deveres. Penso que seja necessário legalizar essa actividade não só pelo facto de um trabalho merecer salário, direitos e deveres, mas também pelo facto de a legalização constituir um elemento chave para a eliminação de barreiras colocadas no caminho dos trabalhadores do sexo. De facto, as dificuldades associadas à integração na comunidade, ao acesso a serviços de saúde, a apoios sociais ou ainda os actos de violência, a estigmatização e rejeição social desapareceriam ou pelos menos atenuar-se-iam com a legalização, tornando a vida dos trabalhadores sexuais menos penosa e mais harmoniosa e segura, sendo um direito ao qual todo e qualquer pessoa beneficia. Esse é o olhar que tenho sobre esse mundo, olhar o qual espero que venha a ser o da nossa sociedade.

Andréa Da Costa